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Teatro e Dança

Memória e construção do futuro nos palcos do DF

Começa hoje a 25ª edição do maior festival de artes cênicas da região central do Brasil

Redação Jornal de Brasília

05/11/2024 12h02

Othon Bastos em 'Não me entrego, não!'. Crédito: Beti Niemeyer

Othon Bastos em ‘Não me entrego, não!’. Crédito: Beti Niemeyer

Por Daniel Xavier

“Um festival de teatro pode ser oportunidade para rever conceitos arraigados, rasgar preconceitos, renovar repertórios e experiências e mirar o novo com afeto”, afirma Guilherme Reis, curador e diretor-geral do projeto Cena Contemporânea, que estreia hoje sua 25ª na capital. 

O Cena Contemporânea nasceu em 1995 com o propósito de dar novo fôlego às artes cênicas em Brasília. De lá para cá, tem se transformado em um dos mais representativos festivais de teatro do país, trazendo ao público espetáculos internacionais inéditos, estreias nacionais e encenações premiadas. Em 2024, não seria diferente. O Festival reafirma seu compromisso de ser um ponto de encontro entre culturas e linguagens, onde o teatro ganha formas, além de agregar outras linguagens da arte e um cenário diversificado.

De hoje a 17 de novembro, o teatro, a dança e a música — artes que expressam emoções, histórias e ideias por meio de palavras, movimento e som — irão ocupar os palcos (e as ruas) do quadradinho, incluindo o Espaço Cultural Renato Russo, o Teatro dos Bancários, o Centro Cultural da ADUnB e o Cine Brasília.

Espetáculo Azira'i - Cena Contemporânea 2024. Crédito: Annelize Tozetto
Espetáculo Azira’i – Cena Contemporânea 2024. Crédito: Annelize Tozetto

Com direção e curadoria do ator Guilherme Reis e com  a direção artística da atriz e jornalista Carmem Moretzsohn, o evento reunirá 20 peças teatrais, exibições cinematográficas e oficinas. Além do Plano Piloto, Ceilândia, Taguatinga e Praça Central do Varjão também receberão apresentações.  

Confira o convite de Guilherme Reis, com destaques para a estreia do festival

Além dos espetáculos, na segunda-feira (11/11), às 20h30, o músico Paulo Miklos fará um show no Centro Cultural da ADUnB, apresentando canções de sua carreira solo e dos Titãs.

Paulo Miklos/ Divulgação
Paulo Miklos/ Divulgação

A partir do dia 12 de novembro, o Cine Brasília exibirá os longas “Reas”, documentário musical de Lola Arias, e “O Diabo na Rua no Meio do Redemunho”, adaptação de Bia Lessa de “Grande Sertão: Veredas”. 

Revelando talentos e construindo pontes

Além das apresentações, o Cena Contemporânea vai além do palco e oferece oficinas de formação, além dos Encontros do Cena, que abordam temas como ancestralidade e etarismo, promovendo um espaço para reflexões e troca de experiências na criação cênica.

O sentimento de dever cumprido enche de orgulho o coração de Guilherme Reis, diretor do projeto, ao ver artistas revelados pelo festival ganhando espaço em grandes eventos. “O Cena sempre buscou o que é inventivo, inovador, sem perder a poesia. Quando olhamos para o mundo, buscamos estar atentos ao que pulsa na mente e na alma dos artistas”, comenta Reis.

A 25ª edição do Cena Contemporânea tem como tema “Memória e Construção de Futuro”, algo que emergiu organicamente do processo de curadoria. Diversos criadores exploram a memória, seja pelo impacto das doenças relacionadas à idade ou pelo apagamento intencional de identidades e histórias. “Sempre foi um problema do mundo e, especialmente, do Brasil: temos memória curta. Mas não queríamos olhar apenas para o ado, e sim resgatá-lo no presente para provocar mudanças no futuro”, afirma Guilherme. “O mundo está muito triste, pesado com guerras e mudanças climáticas. Queremos saber o que as novas gerações têm a dizer, o que podem nos ensinar”, completa.

O festival também destaca a tendência da autobiografia no teatro contemporâneo, como forma de falar do coletivo através do pessoal. Citando Tolstói, o diretor reforça: “Falar da sua aldeia é falar do mundo. A essência humana transcende raças, crenças e gêneros. O Cena Contemporânea abre palcos para essas vozes”, pontua.

Carmem Moretzsohn, diretora artística, também sublinha a importância do projeto ao longo dos anos, ressaltando o impacto internacional. “Já tivemos a oportunidade de conhecer a produção cênica de países como Irã, Japão e Coreia do Sul. Esses artistas, quando possível, participam das atividades formativas, trazendo seus olhares únicos e enriquecendo o intercâmbio com os brasileiros. Isso permite que nossos artistas ampliem suas fronteiras e levem seus trabalhos para fora do país”, explica.

Da plateia ao palco

Juliana Drummond, atriz e diretora de Brasília, nunca esteve longe dos holofotes do Cena Contemporânea. Para ela, o festival é mais que uma vitrine, é um lugar de pertencimento. Desde sua estreia até hoje, Juliana vive e respira o palco, sempre envolvida em produções que desafiam e encantam o público.

“Não sei exatamente quando comecei a participar do Cena, mas 2015 foi um marco com a produção de Desbunde, que dirigi ao lado de Abaetê Queiroz a partir de um texto de Sérgio Maggio. Foi uma obra que impactou muito o festival”, relembra.

A peça, com a provocativa temática “Não somos homens nem mulheres, somos gente”, é ambientada em uma boate fictícia frequentada por artistas que resistem à ditadura militar com escárnio, maquiagem e purpurina, inspirados no movimento de contestação ao AI-5. Em uma noite memorável no Sesc Ceilândia, a peça dividiu a plateia com suas provocações. Durante uma cena polêmica, parte do público se retirou, levando o diretor a interromper o espetáculo e acender as luzes. “Podem ir, quem não quiser assistir”, disse, dando espaço para a liberdade de escolha. Aqueles que ficaram, porém, levantaram-se em aplausos, transformando o teatro em um palco de resistência.

Juliana Drummond/ Divulgação
Juliana Drummond/ Divulgação

Ao longo de sua carreira, Juliana destaca momentos marcantes no Cena Contemporânea: a apresentação de Desbunde em 2014; a residência artística com o grupo espanhol Los Corderos, em 2018, que resultou no espetáculo Metanoia; e a celebração dos 40 anos de Os Saltimbancos em 2019, com apresentações em Ceilândia e no Gama. Durante a pandemia, em 2020, produziu o Poema Confinado, que agora pretende adaptar para o formato presencial.

“Minha trajetória no Cena é de muito orgulho. O festival não só oferece uma programação incrível ao público, como também apoia novos artistas e fortalece o cenário cultural”, conta Juliana.

Com uma paixão que transborda pelos palcos, Drummond define o Cena Contemporânea como urgente e necessário. “Este ano, o festival aborda temas como hospitalidade e identidade, que nos convidam a mergulhar em nossas raízes e explorar nossas singularidades”, conclui. Para ela, o Cena é um espaço de reconexão com a ancestralidade e de redescoberta, onde a arte ilumina caminhos para o futuro.

25ª Cena Contemporânea
De 5 a 17 de novembro. Locais: Espaço Cultural Renato Russo, Teatro dos Bancários, Centro Cultural da ADUnB, Cine Brasília,  Teatro Sesc Ary Barroso 504 Sul, Teatro Sesc Paulo Autran de Taguatinga, Teatro Sesc Newton Rossi de Ceilândia, Praça Central do Varjã. Programação completa: clique aqui. Ingressos: R$ 60,00 (inteira) e R$ 30,00 (meia). Entrada franca nas sessões em Taguatinga e Ceilândia.

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