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Música

‘Liberdade’ de Oruam traz versos explícitos e enredo hollywoodiano

Na noite em que lançou “Liberdade”, Oruam foi preso. Um cavalo de pau “mal calculado”, uma blitz, uma confusão e R$ 60.720 depois, estava de volta às ruas

Redação Jornal de Brasília

21/02/2025 17h07

Atualizada 03/04/2025 23h50

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Foto: Reprodução/Redes Sociais

FOLHAPRESS

Na noite em que lançou “Liberdade”, Oruam foi preso. Um cavalo de pau “mal calculado”, uma blitz, uma confusão e R$ 60.720 depois, estava de volta às ruas. O que poderia ser só mais uma noite caótica na rotina de um dos rappers mais falados do país se transformou no melhor argumento de marketing possível para um disco que já tinha a polêmica estampada na capa.

E talvez seja essa a maior ironia de todas -um álbum chamado “Liberdade” nascendo sob o signo da detenção. Se o episódio foi ou não forjado, cabe ao músico responder.

Mas e o som? Bem, “Liberdade” não é um disco que pede licença para entrar. Ele chega arrombando a porta, distribuindo versos pesados, batidas carregadas de tensão e um discurso que transita entre a contestação e a ostentação, tudo em trap que ora se aproxima do funk, ora assume um tom mais melódico.

Importante ressaltar que Oruam despeja sua verdade, gerada no seu universo, doa a quem doer. A abertura com “22 Meu Vulgo” já dá o tom: “ouro no pescoço, terror dos invejosos, respeito à bala”. Não há espaço para rodeios.

O ponto alto do disco talvez seja “Lei Anti O.R.U.A.M.”, em que o rapper traduz em versos a tentativa de silenciamento institucional. A música não se esquiva do peso das ruas: “Eles dão arma pra nós, depois pergunta por que somos bandidos”.

Oruam reflete o paradoxo de um sistema que cria e pune ao mesmo tempo. A faixa se conecta diretamente ao projeto de lei da vereadora Amanda Vettorazzo (União Brasil), que propõe proibir a contratação de artistas com dinheiro público caso façam apologia do crime.

A polêmica não é novidade na carreira de Oruam. No caso do PL, ele não se limitou a criticar: gravou um vídeo em suas redes chamando a vereadora de “doente mental” e insinuando ameaças veladas com frases como “se não, você vai conhecer o capeta”. O resultado foi uma enxurrada de ameaças, inclusive de estupro, à vereadora, que precisou registrar um Boletim de Ocorrência e agora anda escoltada.

O impacto desse episódio ressoa na temática do disco. “Madrugada é Solidão”, com Poze do Rodo, assume um tom quase confessional. Entre versos sobre julgamento e sobrevivência, Oruam deixa claro que, para quem veio da favela, liberdade nunca foi um conceito absoluto, mas sim uma batalha diária.
“Complexo do Lins” reforça esse retrato: “Complexo do Lins, tem G3, AR e Parafal/ Se tenta subir, a rajada sai no natural”. Aqui, a letra é mais do que uma exaltação ao território: Oruam narra, e é exatamente isso que incomoda tanto quem o tenta criminalizar.

Mesmo jovem, com 23 anos, o artista carrega o peso do nome do pai. Filho de Marcinho VP, preso e condenado a 36 anos por dois homicídios, o rapper pede liberdade para o pai no disco. Há quem veja loucura, há quem veja afeto. Oruam, no entanto, tem usado essa narrativa como tática para se manter diariamente em evidência na mídia -algo que políticos fazem com frequência, muitas vezes sem julgamentos.

O disco se equilibra entre momentos de pura fúria, como “Avançando Muito” e “AK de Bipé”, e instantes de introspecção, como “Mente de um Astro” e “Vazio” com Orochi, mostrando um artista que, mesmo no meio de controvérsias e um universo bem agitado, entende a importância de contar histórias e criar narrativas. Mas até que ponto essa história é sua e até que ponto é um roteiro previamente definido pelo mercado?

Oruam não precisa provar nada para ninguém -seus números no streaming garantem que seu público está consolidado. Isso prova que nada é acidental, e talvez seja isso que mais impressiona: a forma como tudo se encaixa e se retroalimenta como em uma narrativa hollywoodiana.

No fim das contas, “Liberdade” é um disco que impacta, você sendo ou não fã do artista. Assim como jovens negros e favelados, o fato de existir já é suficiente para incomodar alguns. Oruam sabe que está no olho do furacão e parece confortável ali.

O que resta ao ouvinte é decidir se quer entrar no “trem do 22”, se prefere assistir de longe ou se vai se juntar aos que o odeiam. Seja qual for a escolha, o fato é que Oruam já venceu e continuará vencendo.

LIBERDADE
– Avaliação Bom
– Autoria Oruam
– Gravadora Oruam Distribuições
– Onde ouvir Disponível nas plataformas de streaming

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