NICOLA PAMPLONA
RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS)
A discussão sobre a perfuração de um poço para exploração de petróleo na bacia da Foz do Amazonas não é o único embate entre a Petrobras e a área ambiental do governo na região conhecida como margem equatorial e apontada como a principal fronteira exploratória do país.
Em 2021, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis) concluiu pela inviabilidade da perfuração de outros dois poços na região, na bacia de Barreirinhas, localizada frente ao litoral do Maranhão e do Piauí.
A negativa ficou em segundo plano, diante da prioridade dada pela Petrobras ao debate sobre a Foz do Amazonas, mas reforça as dificuldades que o setor terá na região, que vai do litoral do Ceará à fronteira com a Guiana sa.
Atualmente, há 37 concessões marítimas para exploração de petróleo nas cinco bacias que compõem a margem equatorial: Potiguar, Ceará, Barreirinhas, Pará-Maranhão e Foz do Amazonas. Destas, 16 estão suspensas por questões ambientais nas três últimas bacias.
A maior parte dos contratos suspensos está na bacia de Barreirinhas: são 10 dos 14 contratos em vigência atualmente. No início de agosto, consórcio liderado pela Shell decidiu devolver quatro concessões nessa área, arrematadas em 2013 por um valor equivalente hoje a R$ 480 milhões.
Além de abrir mão do valor pago como bônus de , as empresas do consórcio perdem também os investimentos feitos em pesquisas sísmicas, espécie de ultrassonografia do subsolo, nas concessões.
Em nota, a Shell não relaciona a decisão a problemas de licenciamento. Diz que o resultado da pesquisa foi menos satisfatório do que o esperado e que o consórcio decidiu entregar as concessões “após um processo de revisão de portfólio, que considera a estratégia das companhias”
Os blocos devolvidos eram colados nas concessões em que a Petrobras planejava furar dois poços, mas teve a licença negada pelo Ibama, sob o argumento de que não há plano de emergência ou estrutura de resposta que possa garantir a proteção de corais e manguezais em caso de vazamento na região.
Alvos da Petrobras, os blocos 3 e 5 da Bacia de Barreirinhas ficam a cerca de 140 quilômetros da costa, na altura da capital maranhense, em lâmina d’água (distância entre a superfície e o fundo do mar) de cerca de 2.400 metros.
A Petrobras iniciou o pedido de licença do bloco 5 em 2006 e do bloco 3 em 2010, mas o Ibama decidiu unificar os processos em 2019.
O relatório de impacto ambiental entregue pela estatal em dezembro daquele ano previa o início da perfuração no bloco 5 em novembro de 2020. O poço no bloco 3 seria iniciado em abril de 2022. O parecer recomendando indeferimento da licença veio em junho de 2021 e a negativa, em dezembro.
O relatório aponta possíveis impactos de alta sensibilidade, alta magnitude e grande importância em caso de vazamento, tanto do ponto de vista ambiental quanto do ponto de vista social, atingindo unidades de conservação e atividades econômicas como a pesca.
Mas diz que a probabilidade de vazamento é pequena e que a atividade será realizada “de forma segura e eficiente”, com plano de emergência adequado. Por isso, “não deverão acarretar comprometimento da qualidade socioambiental da região”.
A área técnica do Ibama, porém, entende que não há plano de emergência ou estrutura de resposta “que possa garantir a efetiva proteção dos ecossistemas coralíneos e manguezais da costa em caso de ‘blowout’ [explosão] do poço ou mesmo em incidentes com volumes menores”.
E que os impactos de um acidente podem ser irreversíveis “não sendo possível estabelecer um prazo seguro de recuperação de ecossistemas como manguezais e de espécies ameaçadas como peixes-boi e inúmeras espécies de aves e quelônios [tartarugas] que ocorrem na região”.
Além de Foz do Amazonas e Barreirinhas, outra bacia da margem equatorial enfrenta restrições ambientais, a do Pará-Maranhão. Lá as cinco concessões vigentes atualmente estão suspensas atualmente.
O Ibama contesta que a falta de licenças esteja atrasando a atividade. Diz que planejamento feito com o setor para o triênio de 2023 a 2025 considera a avaliação de três pedidos para seis poços na margem equatorial.
São os dois pedidos já negados à Petrobras, na Foz do Amazonas e em Barreirinhas, e um outro pedido da estatal para três poços na bacia Potiguar, ainda em avaliação. Essa região já tem produção de petróleo, o que leva a companhia a crer que obterá a autorização.
Na área ambiental do governo, há um sentimento de que não há grande esforço das petroleiras para aprovar poços na região e que a suspensão das concessões é cômoda, pois retarda os investimentos previstos em contrato.
Em nota, a Petrobras diz que tem um histórico de quase 3.000 poços perfurados em águas profundas e ultraprofundas, “sem qualquer tipo de intercorrência”.
“O que, associado à capacidade técnica e experiência acumulada em quase 70 anos, habilitam a companhia a abrir novas fronteiras e lidar com total segurança com a sensibilidade ambiental da margem equatorial”, continua.
O plano estratégico da companhia separou US$ 3 bilhões (quase R$ 15 bilhões) para poços nessa região até 2027. Segundo a ANP, a margem equatorial concentra quase metade dos investimentos em poços marítimos previstos no país até 2027.