FÁBIO PESCARINI
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
A Cetesb (Companhia Ambiental do Estado) emitiu quatro alertas para a Prefeitura de Jundiaí (a 58 km de São Paulo) sobre a vulnerabilidade dos lagos do Parque Botânico Tulipas Professor Aziz Ab’Saber, onde um derramamento de corante no último dia 13 matou mais de cem peixes e coloriu de azul patos, gansos e capivaras, entre outros animais.
A carga com 2.000 litros do produto químico estava em um caminhão que bateu em um poste próximo ao parque e se espalhou quando a carroceria tombou. O caso está sendo investigado pelo Ministério Público.
Segundo a Prefeitura de Jundiaí, devido à grande quantidade derramada, o produto escoou até uma boca de lobo localizada a cerca de 50 metros do local do impacto. Ela tem ligação direta com o córrego do Jardim das Tulipas, que atravessa o parque do bairro e deságua no rio Jundiaí, que deságua em cidades vizinhas, como Itupeva, Salto e Indaiatuba.
De acordo com a Cetesb, a primeira comunicação formal foi em 2013. Todas alertam a prefeitura sobre necessidade de proteção dos lagos do parque municipal, que fica em uma região cercada por indústrias e é próximo da rodovia dos Bandeirantes.
Em um desses ofícios, de 24 de junho de 2020, a companhia ambiental recomenda que a drenagem de águas pluviais do bairro seja desviada para lançamento “em ponto à jusante dos lagos”.
Se essa intervenção não fosse possível, a sugestão era a implantação de um sistema para contenção de águas pluviais contendo resíduos e poluentes, antes de sua descarga nos lagos.
“Para tanto, poderiam ser implantadas, nos pontos de entrada do parque, caixas de retenção de sólidos e separadoras água-óleo, projetadas conforme vazão estimada”, diz.
Questionada se atendeu às recomendações dos quatro ofícios, a Prefeitura de Jundiaí diz que a gestão Gustavo Martinelli (União) tomou ciência das notificações enviadas anteriormente pela Cetesb e que vem discutindo medidas para mitigar os impactos ambientais no Parque Botânico Tulipas.
A gestão do ex-prefeito Luiz Fernando Machado (PL), que comandou a cidade nos dois mandatos anteriores, diz ser prudente aguardar a apuração de responsabilidades pelas autoridades ambientais competentes, pois a causa primária do último derramamento de corante está relacionada à ocorrência do acidente com o veículo que transportava a substância.
Em outro ofício, de janeiro de 2020, a Cetesb lista problemas ambientais que atingiram os lagos do parque. Em um deles, no ano anterior, um acidente na rodovia dos Bandeirantes provocou o derramamento de 17 mil litros de óleo de soja, que escorreram para o local. Na ocasião foi necessária a instalação de uma barreira flutuante e remoção de patos.
Três meses depois, ocorreu lançamento de efluente oleoso vindo de um posto de combustível e, em dezembro daquele ano, espuma de combate a incêndio atingiu as águas do lago pela galeria de águas pluviais, assim como aconteceu com corante há duas semanas.
A UGISP (Unidade de Gestão de Infraestrutura e Serviços Públicos) da prefeitura afirma que o lago foi esvaziado com o objetivo de reduzir os danos ao ecossistema local com o acidente do último dia 13.
A prefeitura diz também conduzir ações de limpeza e desassoreamento, além de estar elaborando um plano de obras para o desvio das galerias de águas pluviais, intervenção apontada como complexa, pois exige a integrações com órgãos estaduais e a concessionária CCR, responsável pela rodovia dos Bandeirantes.
“Reforçamos o compromisso com a recuperação ambiental da área e informamos que o reenchimento do lago será realizado apenas após a conclusão de todas as obras necessárias, garantindo melhores condições ambientais e de segurança”, diz a pasta. “No momento, não há um prazo definido para o reenchimento, justamente devido à complexidade das intervenções em curso.”
Conforme a Cetesb, os laudos das amostras de água coletadas indicaram toxicidade aguda das águas do lago, compatível com os impactos observados. “No rio Jundiaí, embora tenha havido um pequeno extravasamento de corante, não houve impacto na qualidade da água”, afirma a companhia ambiental.
Cláudio da Cunha, coordenador da Faculdade de Tecnologia em Gestão Ambiental da Fatec (Faculdade de Tecnologia) de Jundiaí, diz que o produto químico que vazou no lago é o corante verde malaquita, que tem coloração variada, dependendo das condições de acidez e concentração
Em baixa concentração, explica, a toxicidade é pequena. “Entretanto, quando ela é muito alta, começa a entrar na categoria de substâncias tóxicas”, afirma. “Pode produzir alterações nos genes e se tornar cancerígena.”
O problema, diz, é que é difícil mensurar quanto tempo levará a recuperação ambiental, pois é um acidente inédito. “Não há precedentes para comparação.”
Como mostrou a Folha de S.Paulo, veterinários da Associação Mata Ciliar, organização que é referência nacional no tratamento de animais silvestres, tem monitorado duas vezes ao dia os bichos azuis que ficaram no parque e os três gansos e o pato resgatados.
O especialista defende a realização de uma análise sobre o sistema de águas pluviais na região do parque –pode haver a necessidade da implantação de caixas de contenção ou sistemas de desvio em caso de acidente.
Para o vereador de Jundiaí Henrique Parra Parra Filho, de mandato coletivo do PSOL, é preciso ordenar a circulação de determinadas cargas pela região do parque, que fica em meio a indústrias químicas e alimentícias. “Mas isso não é fácil de operar.”
Sobre o recente acidente, a Cetesb prepara um relatório técnico que embasará o auto de infração, onde são determinadas penalidades para a empresa responsável pelo corante.
Não existe multa municipal para acidentes ambientais como esse, mas há um projeto sobre o tema em discussão na Câmara Municipal.
“A istração municipal segue acompanhando o caso de perto e colaborando com os órgãos responsáveis para garantir a responsabilização adequada e a adoção das medidas corretivas necessárias”, diz a prefeitura.
A reportagem ligou para o número que conta no site da empresa Farkon, responsável pela produção do corante que vazou no parque, mas ninguém atendeu. Também não houve resposta ao email enviado.