Durante o renomado evento Contrade dell’Etna, que reúne produtores, especialistas e entusiastas no majestoso cenário do vulcão siciliano, uma das palestras mais aguardadas foi conduzida por Federico Latteri — jornalista especializado em vinhos da Sicília, profundo conhecedor da viticultura no Etna e autor do prestigiado Guia de Vinhos do Etna. Com uma didática envolvente e riqueza de detalhes, Latteri conduziu os participantes por uma verdadeira jornada sensorial e cultural através dos espumantes Etna DOC — vinhos que nascem de um dos terroirs mais singulares do mundo.
Etna: um vulcão, um território, um vinho com alma
Localizado na costa leste da Sicília, o monte Etna é o maior vulcão ativo da Europa. Sua constante atividade molda não apenas a paisagem ao redor, mas também o solo, o microclima e, consequentemente, a viticultura local. O solo vulcânico, rico em minerais e com excelente drenagem, aliado à altitude elevada das vinhas (frequentemente acima de 800 metros), proporciona uvas com notável acidez, frescor e complexidade aromática. Não por acaso, os vinhos do Etna — tintos, brancos e, agora, espumantes — vêm conquistando paladares exigentes em todo o mundo.
Identidade autêntica: o diferencial dos espumantes Etna DOC
Em entrevista exclusiva concedida durante o evento, Federico Latteri destacou os elementos que tornam os espumantes Etna DOC únicos dentro do panorama italiano. Ao contrário de regiões como Franciacorta ou Trento DOC, que utilizam majoritariamente castas internacionais como Chardonnay e Pinot Noir, os espumantes do Etna têm uma alma 100% siciliana. São produzidos principalmente com a uva tinta autóctone Nerello Mascalese, vinificada em branco ou rosé, compondo no mínimo 60% do blend, conforme as regras da denominação.
Outro destaque é a uva branca Carricante, uma preciosidade local que tem atraído produtores em busca de ainda mais tipicidade e frescor. Apesar de ainda não estar oficialmente contemplada na legislação da DOC para espumantes, a Carricante já vem sendo usada em rótulos que devem, em breve, ser reconhecidos formalmente, refletindo o dinamismo e a inovação da viticultura no Etna.

Foto: Divulgação
Método clássico e terroir: um casamento perfeito
Para Latteri, o uso obrigatório do método clássico (o mesmo utilizado em Champagne) é fundamental para evidenciar a identidade dos espumantes do Etna. A segunda fermentação em garrafa, seguida de longos períodos de autólise, permite que a mineralidade, o perfil cítrico e a fruta elegante do Nerello Mascalese se expressem de forma complexa, fresca e refinada, com excelente capacidade de envelhecimento.
A altitude e os solos vulcânicos são aliados importantes nesse processo. Como as uvas para espumantes são colhidas precocemente — geralmente entre o início e a metade de setembro —, o resultado são vinhos vibrantes, com acidez marcante e notas salinas e minerais que refletem fielmente o caráter do território.
Tradição e renascimento
Apesar de os espumantes Etna DOC terem ganhado projeção apenas nos últimos anos, a possibilidade de sua produção está prevista desde a criação da denominação, em 1968 — a primeira da Sicília. Desde então, a legislação já autorizava a elaboração de espumantes pelo método clássico, embora esse estilo tenha sido, por muito tempo, pouco explorado.
Latteri relembra um episódio curioso do século XIX: o Barão Spitaleri já produzia espumantes no Etna utilizando o método clássico e rotulava seus vinhos como “Champanhe do Etna” — algo que hoje seria proibido, mas que revela a antiga vocação da região para borbulhas de qualidade.
Durante décadas, a produção de espumantes foi restrita a uma única vinícola pioneira. No entanto, nos últimos anos, impulsionados pelo reconhecimento do terroir vulcânico e pela demanda crescente por vinhos frescos e autênticos, os espumantes do Etna ganharam força. Hoje, dezenas de produtores — grandes, médios e pequenos — apostam nessa vertente como uma das expressões mais promissoras da DOC Etna.
Um futuro promissor
Com o mercado internacional cada vez mais receptivo a espumantes frescos, secos e gastronômicos, os vinhos efervescentes do Etna encontram um público sedento por novidade e autenticidade. “Os espumantes do Etna têm tudo para crescer: identidade própria, terroir único e um perfil que agrada ao consumidor moderno”, resume Latteri.
Conclusão
Beber um espumante Etna DOC é mais do que saborear um bom vinho: é experimentar a energia de um território que pulsa sob os pés, a sabedoria de um povo que cultiva a videira há séculos e a visão de uma nova geração que olha para o futuro com uma taça em mãos. Que as borbulhas do Etna continuem subindo — e conquistando o mundo.