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Cinema com ela
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Delírio a Dois: O tom musical e o peso de ser o Coringa 

O conceito é audacioso, mas a execução não corresponde em um filme que se distancia do impacto de “Coringa” (2019)

Tamires Rodrigues

03/10/2024 5h00

Atualizada 02/10/2024 20h11

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A química entre Lady Gaga e Joaquin Phoenix cria um dinamismo intrigante. — Foto: Divulgação/Warner Bros. Pictures

Todd Phillips entrega uma sequência que desafia as expectativas ao transformar o Coringa de Joaquin Phoenix em protagonista de um musical. “Coringa: Delírio a Dois” se a após os eventos do aclamado primeiro filme de 2019, que explorou a jornada sombria de um homem em busca de aceitação em uma sociedade que o marginaliza, trazendo uma performance intensa e visceral de Phoenix. Agora, com a adição de Lady Gaga no papel de Lee Quinzel, o longa tenta levar a história a um novo território. No entanto, apesar do potencial inegável de seus protagonistas, a nova narrativa não consegue capturar a profundidade e a complexidade que tornaram o original tão memorável.

A história começa no Arkham State Hospital, onde Arthur Fleck (Phoenix) enfrenta a consequência de seus crimes, prestes a ser julgado. Ele é uma sombra do homem que se tornou o Coringa, preso em uma cela suja e cercado por guardas que se divertem com seu sofrimento. A fama que Arthur conquistou por matar o apresentador de talk show Murray Franklin (Robert De Niro) paira sobre ele como uma maldição: amado por alguns, odiado por muitos. É nesse ambiente que ele encontra Lee Quinzel (Gaga), uma presidiária que idolatra suas ações, levando o espectador a crer que essa conexão poderia trazer à tona uma nova forma de insanidade.

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Foto: Divulgação/Warner Bros. Pictures

A trama mistura delírio e realidade em meio a números musicais e um tom mais introspectivo, enquanto o filme questiona a linha entre a sanidade e a loucura compartilhada. Embora “Coringa: Delírio a Dois” tenha uma proposta arrojada ao mesclar musical e tragédia psicológica, a execução deixa a desejar em alguns momentos. 

Todd Phillips, busca expandir a complexidade do universo criado em 2019. Ele se arrisca ao misturar gêneros, transformando a sequência em um musical que promete um olhar novo sobre a psique de Arthur Fleck. No entanto, apesar da ambição, a abordagem às vezes parece hesitante, como se a visão ousada do primeiro filme se perdesse em meio aos números musicais. Phillips tenta equilibrar o drama sombrio com a leveza das músicas, mas o resultado final fica aquém das expectativas.

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Foto: Divulgação/Warner Bros. Pictures

Joaquin Phoenix, mais uma vez no papel de Arthur Fleck, entrega uma performance profundamente envolvente que capta a essência de um homem consumido por seus demônios. Sua habilidade de transmitir vulnerabilidade e desespero é palpável, e ele consegue navegar entre momentos de fragilidade e explosões emocionais com maestria. Ainda assim, apesar de sua atuação magistral, o longa não parece explorar totalmente a profundidade do personagem, deixando algumas questões não resolvidas em sua evolução. Phoenix continua a ser uma força poderosa no papel, mas as limitações da história prejudicam a riqueza que sua performance poderia alcançar.

Arthur Fleck, que no primeiro filme representava uma explosão de desespero e violência, aqui parece preso a uma trama que limita sua essência imprevisível e caótica. A transição de uma figura implacável para um protagonista que canta e dança sua dor retira um pouco da força da sua persona. O relacionamento entre Arthur e Lee é, sem dúvida, o ponto central da produção.

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Foto: Divulgação/Warner Bros. Pictures

O conceito musical é intrigante, mas a execução deixa a desejar. As canções escolhidas, muitas delas de um ado distante, não ressoam como esperávamos. Arthur canta “Bewitched, Bothered and Bewildered” em uma entrevista na prisão, mas essa abordagem não provoca a mesma emoção do que poderia. Ao lidar com a questão da personalidade dividida, repete uma proposta já explorada em “Coringa” (2019), tornando-se um tanto redundante.

Lady Gaga brilha como Lee Quinzel, trazendo uma intensidade que cativa desde o primeiro momento. Seu talento musical é inegável, mas a atuação aqui revela uma faceta mais sombria e vulnerável. A química entre ela e Joaquin Phoenix cria um dinamismo intrigante, embora sua personagem, em certos momentos, pareça um pouco subdesenvolvida, limitando o impacto de sua performance. Apesar disso, Gaga entrega momentos memoráveis, especialmente quando se conecta emocionalmente com Arthur, mostrando que, mesmo em meio à loucura, há espaço para a esperança e a paixão.

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Foto: Divulgação/Warner Bros. Pictures

O figurino e a direção de arte em “Coringa: Delírio a Dois” são elementos essenciais que enriquecem a atmosfera do filme. A estética dos anos 40 é capturada com maestria, refletindo a dualidade entre a realidade sombria de Arthur e os sonhos extravagantes que permeiam sua mente. O figurino de Lady Gaga, com seu cabelo platinado e roupas vibrantes, contrastam com o estado debilitado de Joaquin Phoenix, enfatizando a jornada emocional de ambos os personagens. A direção de arte feita com competência por Mark Friedberg complementa essa visão, criando cenários que evocam tanto a opressão de Arkham quanto o brilho ilusório dos números musicais, resultando em uma experiência visual que intensifica as tensões psicológicas.

No entanto, o ritmo do filme por vezes se perde entre os números musicais e os momentos mais dramáticos, fazendo com que a química entre os dois oscile. Os momentos de grande impacto visual, como as cenas com músicas mais elaboradas, se destacam pela excentricidade, mas a narrativa por vezes parece arrastada, com a ação sendo substituída por diálogos introspectivos que nem sempre aprofundam os personagens. O longa propõe explorar as consequências psicológicas de viver à sombra do Coringa, mas o resultado é uma história que, ao final, pode deixar a sensação de que faltou um toque mais afiado, mais ameaçador.

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Foto: Divulgação/Warner Bros. Pictures

Conclusão

“Coringa: Delírio a Dois” apresenta uma abordagem ousada que se afasta do padrão típico das histórias de super-heróis, propondo uma reflexão mais profunda sobre temas como amor, loucura e identidade. Essa busca por inovação é um respiro em um cenário cinematográfico saturado de narrativas previsíveis e fórmulas repetitivas. Ao invés de seguir a trilha de um vilão caótico em um mundo de ação desenfreada, o longa se aprofunda na psicologia de seus personagens, oferecendo uma visão mais intimista e humana. No entanto, essa mudança de foco pode desagradar aqueles que esperavam um espetáculo de anarquia e subversão, elementos que tornaram o Coringa de 2019 tão icônico. Assim, “Coringa: Delírio a Dois” desafia não apenas as expectativas do público, mas também o próprio gênero ao qual pertence, caminhando em um território arriscado que pode tanto cativar quanto confundir sua audiência.

Confira o trailer: 

Ficha Técnica
Direção:
Todd Phillips;
Roteiro: Scott Silver, Todd Phillips;
Elenco: Joaquin Phoenix, Lady Gaga, Brendan Gleeson, Catherine Keener, Zazie Beetz, Harry Lawley, Steve Coogan, Leigh Gill, Sharon Washington, Jacob Lofland, Ken Leung, Bill Smitrovich;
Gênero: Drama, Musical;
Duração: 138 minutos;
Distribuição: Warner Bros. Pictures;
Classificação indicativa: 16 anos;
Assistiu à cabine de imprensa a convite da Espaço Z

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